quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

Maravilhosas Coisas Pequenas

Quando penso sobre coisas pequenas, lembro-me logo do salário do Professor Raimundo e do intervalo de vida de uma Ephemeroptera adulta (mais conhecida como "efémera", esse inseto vive apenas algumas horas), mas uma das coisas que encabeça essa lista certamente é o tímido Neutrino. Digo que é tímido porque esta partícula subatômica possui uma fraca interação com a matéria e dificilmente é detectada.

O neutrino é tão ridiculamente pequeno que pode atravessar a Terra em uma fração de segundos como se o planeta não existisse. Para falar a verdade, se quiséssemos parar um neutrino desgarrado, teríamos que usar, em média, uma parede de chumbo com uma espessura de vários anos-luz. É o tipo da coisa, se pudéssemos ter uma conversa com um neutrino para avisa-lo que ele estava prestes a se "chocar" com uma parede de chumbo de bilhões de quilômetros de espessura, a conversa seria mais ou menos assim: "Ei Sr. Neutrino, cuidado! Tem uma parede gigantesca na sua frente!", ao que o neutrino prontamente responderia: "Onde?". Então quando ele já estivesse lá pela metade do caminho por dentro da parede, ficaria imaginando se aquela pessoa não sofre de algum tipo de alucinação.

Outra coisa pequena é o nosso planeta diante da imensidão do universo. A espaço-nave Voyager 1 foi lançada em 5 de Setembro de 1977 e hoje é o objeto de fabricação humana mais distante da Terra, já tendo ultrapassado os limites do nosso sistema solar. Sabendo disso e curioso como só ele, o astrônomo Carl Sagan teve a interessante idéia de pedir para o pessoal da NASA fazer uma manobra arriscada. Ele deve ter dito algo como: "Ei pessoal, já que a gente não tá fazendo nada agora, que tal girar a câmera da Voyager 1 pra trás e tirar uma foto da Terra? Aproveitem para olhar para cima, abrir aquele sorriso e dar um tchauzinho!". O pessoal não gostou muito da idéia, pois seria uma operação bastante trabalhosa e arriscada, mas depois de muita resistência, aceitaram o pedido. Em 14 de Fevereiro de 1990, já tendo percorrido 6,4 bilhões de quilômetros, a Voyager 1 capturou a imagem da nossa Terra. Um mundo inteiro preenchendo apenas 0,12 pixel numa fotografia.

Fotografia do planeta Terra tirada pela Voyager 1 de uma distância de 6,4 bilhões de quilômetros, representada pelo minúsculo pontinho dentro do círculo azul

Isso nos faz pensar sobre o nosso lugar no universo. Inspirado pela foto, Carl Sagan escreveu o livro "Pálido Ponto Azul" (Pale Blue Dot), onde discute sobre o lugar da humanidade na arena cósmica. Temos que ser bastante humildes diante disso tudo. Certa vez, já pensamos estar no centro do universo, com os planetas e estrelas girando ao nosso redor, para depois descobrimos que não era bem assim. De fato, nós é que estávamos habitando um pequeno planeta errante que, junto com vários outros astros, gira ao redor de uma estrela medíocre e esquecida num canto de uma galáxia qualquer dentre tantas outras. Por um tempo ainda continuamos achando que a espécie humana era o ápice da criação, quando então percebemos que somos apenas um acidental ramo tardio de um incomensurável arbusto que se ramifica copiosamente ao longo das eras geológicas, e que a nossa futura e inevitável extinção não afetará nem minimamente a economia cósmica.

Localização do nosso Sol dentro da galáxia Via Láctea que possui aproximadamente 400 bilhões de estrelas

A Terra, apesar de sua notória pequenez, tem sua merecida importância. É o nosso lar, e isso a faz mais especial do que qualquer outro planeta. Um trecho do livro "Pálido Ponto Azul" diz: "Toda a nossa mistura de alegria e sofrimento, todas as inúmeras religiões, ideologias e doutrinas econômicas, todos os caçadores e saqueadores, heróis e covardes, criadores e destruidores de civilizações, reis e camponeses, jovens casais apaixonados, pais e mães, todas as crianças, todos os inventores e exploradores, professores de moral, políticos corruptos, 'superastros', 'líderes supremos', todos os santos e pecadores da história de nossa espécie, ali - num grão de poeira suspenso num raio de sol."

A Terra abunda em vida, o que a torna mais interessante do que qualquer planeta gigante e desabitado. Fica na esquina esquecida de uma galáxia dentre centenas de bilhões de outras, mas tem seu brilho todo especial. E nós, mesmo sendo um simples ramo de uma gigantesca árvore da vida, podemos nos maravilhar com toda essa beleza. Por menores que sejamos e por mais insignificantes que pareçamos, a vida é valiosa e representa a maior das maravilhas da natureza. Nós, especificamente, ainda temos o privilégio de sermos seres conscientes e inteligentes. E a inteligência deve ser um artigo raro no universo, por mais abundante de vida que ele deva provavelmente ser em tantos outros lugares.

De acordo com o biólogo Christian De Duve, laureado com o Prêmio Nobel de Fisiologia, no seu livro "Poeira Vital" afirma: "A vida é uma manifestação natural da matéria.". E eu completo dizendo: "E que manifestação espetacular!". E como comentou Carl Sagan: "Nós somos uma maneira do Cosmos conhecer a si mesmo".

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Isso tudo foi pra dizer q somos uma merdinha no meio do nada????!!!

sexta-feira, janeiro 12, 2007 5:34:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Um pouco mais do que isso! Eu diria que somos umas "merdinhas" maravilhosas e interessantes. É tanto que o título do texto é "Maravilhosas Coisas Pequenas". (OBS.: Aqui usei o termo "merdinha" não no sentido pejorativo, mas referindo-se apenas ao nosso tamanho, porém em relação a sermos interessantes, somos grandiosos).

sábado, janeiro 13, 2007 9:12:00 AM  

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