Reflexos hereditários de um passado distante

As sensações de quem pratica tal esporte são das mais variadas desde um friozinho na barriga até uma grande tontura ao se ver em pé diante de tamanho precipício. O medo é a sensação mais comum diante dessa situação e muitos desistem antes mesmo de subir o primeiro degrau da plataforma. Outros esportes como paraquedismo, rapel e canoagem podem trazer a tona sensações semelhantes.

Chegando nesses locais apropriados para prática desses esportes, mesmo tendo certeza de que é praticamente impossível a chance de se acidentar, a pessoa passa por um processo onde seu corpo reage ao "ilusório" perigo, como se o cérebro não soubesse de toda a segurança envolvida. Imaginemos um lugar onde milhares de pessoas que já saltaram de bungee jumping, tudo funcionando perfeitamente, segurança máxima e divertimento garantido. A pessoa, ao subir na plataforma, completamente equipada e

Observando o cenário descrito, uma perguntinha que pode nos vir a mente é: "Por quê tanto alarde?". O equipamento é seguro, o local é apropriado, a segurança é máxima, milhares de outros já pularam antes em completa segurança sem sofrer nenhum aranhão. Então, por quê o medo? A resposta para essa pergunta está escondida no passado remoto de nossos ancestrais e no cenário em que viveram.
O ambiente no qual nossos ancestrais viveram o que imperava era a lei da selva, literalmente. Matar ou morrer! Fugir e se esconder num lugar seguro ou ser dilacerado pelos dentes do predador faminto. Num ambiente tão agressivo, temos que estar preparados para a sobrevivência. E os mecanismos corporais que nos deixam capazes de reagir são exatamente essas sensações que sentimos quando estamos, mesmo que aparentemente, em perigo. Os nossos genes "querem" se replicar, mas para isso, devem sobreviver, e para sobreviver, numa situação de perigo, tem que deixar o corpo bem alerta. Então, quando nosso cérebro capta imagens que nos parecem perigosas, como os grandes dentes de um feroz predador ou a visão de um desfiladeiro que pode nos derrubar, os processos químicos que se passam no nosso corpo tem que nos deixar bem ligados e nos dar forças imediatas para podermos correr e nos livrarmos do perigo eminente.
No ambiente onde nosso cérebro foi moldado, não existiam cintos ou travas de segurança, mas apenas dentes afiados, precipícios mortais e pernas para correr. Até uns pouco milhares de anos atrás nada como paraquedismo ou bungee jumping com seus equipamentos de segurança máxima estava nem perto de existir. A evolução biológica é um processo muito lento contado em termos geológicos, e não pode acompanhar nem de perto a evolução das civilizações, e muito menos a evolução tecnológica. Em 100 mil anos, nossos genes não mudaram quase nada, mas em apenas algumas décadas toda a tecnologia mudou incontáveis vezes.

Então, quando nos colocamos em pé numa plataforma há centenas de metros do chão, o que o nosso cérebro entende é o seguinte: "Lugares altos são perigosos. Deve ser liberada adrenalina para deixar o corpo mais alerta. Dilatar as pupilas para ver melhor. Tentar sair desse lugar o mais rápido possível.". E quando um mergulhador está dentro de uma jaula aquática observando a vida de tubarões, o seu cérebro entende: "Animais com aparência agressiva são perigosos. Evitar aproximar-se do animal. Sair rápido desse lugar.". Não tem como o nossos genes e cérebro "saberem", a priori, que aqueles equipamentos de segurança evitariam a morte. Essas variáveis modernas não estão programadas nos nossos genes e o "cabeamento" dos nossos neurônios está montado justamente para considerar aquilo como perigo extremo. Da exata mesma forma que, quando uma pessoa faz um transplante de coração e precisa tomar remédios contra a rejeição do tecido estranho, não dá para avisar aos anticorpos para não atacarem aquele novo órgão. Os anticorpos estão programados para lidarem como se fosse um alienígena intruso (algo que realmente é), e é por isso que existe a rejeição do novo orgão que pode causar uma infecção e até a morte, caso não sejam administrados medicamentos repressores de anticorpos. Mais uma vez, como os anticorpos "saberiam" que não se deve atacar o tecido implantado? Simplesmente não dá. Temos inevitavelmente que conviver com os reflexos hereditários de um passado distante.

Sendo animais gregários e sociais, vivemos em sociedades onde os indivíduos precisam uns dos outros para sobreviver. Sentimos vontade de estarmos próximos uns dos outros, de comunicarmo-nos, de trocarmos favores, enfim, conseguimos nos colocar no lugar do outro, identificando-nos com ele e sentindo compaixão pelo próximo. Nossa espécie evoluiu num ambiente de bandos com poucas dezenas de indivíduos, onde a ajuda mútua era imprescindível. Para se ter uma idéia de como era o estilo de vida dos nossos tataravós símios, seria algo bem parecido em como vivem os bandos de babuínos, hoje em dia. Os indivíduos tem interesses próprios, obviamente, e uma forma de acordo social é exatamente a troca recíproca de favores

Hoje em dia, vivemos em grandes cidades com milhões de habitantes. Rotineiramente não estamos cercados de primos e nem de irmãos, e nem podemos contar com a retribuição futura de favores, quando, muito provavelmente, uma pessoa que conhecemos hoje, talvez nunca mais a vejamos. No entanto, mais uma vez, a nossa solicitude mútua provém também dessas heranças evolutivas e, muito provavelmente, sentiremos o desejo de ajudar o outro em alguma coisa. Em parte, isso explica a origem da nossa moralidade. De fato, como os nossos genes e cérebros "saberão", a priori, que aquele desconhecido não é o nosso companheiro e querido irmão? De certa forma, é nosso irmão, mesmo que desconhecido.
2 Comments:
eh como diria um amigo meu: "naum somos mais q macacos desenvolvidos". E em uma outra entrevista ouvi um cientista dizer. "o ser humano eh em sua essencia vilento, a educaçao eh uma forma de civiliza-lo. Qdo agimos de forma violenta apenas voltamos ao tempo de nossos ancestrais comum"
Acho tbem q inveja, posse entre outros sentimentos podres sao heranças desse desenvolvimento. Somos tao atrasados q consequimos dominar muita coisa mas esquecemos de dominar a nos mesmos. Observe os animais(lembre-se: animais naum pensam, apenas reacionam) e vejam q cada animail(ou especie) tem uma forma peculiar de se comportar. E muitas delas se parecem com o homem.
Parabens Juliano por mais um belo texto.
Você disse: "lembre-se: animais naum pensam". Não é bem assim! Os animais que possuem cérebro pensam sim. Claro que de forma bem diferente da nossa. Muito mais simples, digamos assim. Mas vendo um exemplo bem próximo do homem, os orangotantos estão entre os mais habilidosos fugitivos. Eles constroem ferramentas, enganam os tratadores do zoológico, escondem as peças, e quando não tem ninguém vendo, usam um pedaço de arame para abrir a porta da jaula. Se isso não é pensamento, então não sei o que é. E se formos falar em chimpanzés, estes é que pensam mesmo. Podem até reconhecer-se no espelho, apendrer a linguagem dos sinais dos surdos, dentre tantas outras coisas. Mesmo na vida selvagem, eles têm um sistema social bem organizado, troca de mercadorias e esse tipo de coisa.
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