domingo, 11 de fevereiro de 2007

12 de Fevereiro: Dia de Darwin

Hoje faz 198 anos que Charles Darwin nasceu (não é um número redondo, mas tudo bem). Melhor será daqui há dois anos quando estaremos comemorando seu bicentenário de nascimento. Charles Darwin nasceu em 12 de Fevereiro de 1809 e cinqüenta anos depois, mudou a história da humanidade para sempre, dando, finalmente, um entendimento coerente sobre a origem das espécies, inclusive do homem. Então, todo dia 12 de Fevereiro, comemora-se internacionalmente, não apenas a descoberta de Darwin, mas o enorme benefício que o conhecimento científico em inúmeros campos, adquirido através da curiosidade e engenhosidade humana para o avanço da humanidade numa expressão de gratidão. E Darwin foi usado como personagem desse dia, por sua descoberta ter resolvido de uma vez por todas o principal questionamento e mais antigo da humanidade: "De onde nós viemos?". O objetivo do Dia de Darwin é encorajar as instituições que existem em todo o mundo, tais como as municipalidades, escolas públicas e privadas, faculdades e universidades, bibliotecas, museus, igrejas, organizações privadas e indivíduos para celebrarem juntos a Ciência e a Humanidade todo ano. (Coincidentemente, nesse mesmo dia nasceu outro grande homem, Abraham Lincoln, que foi presidente dos Estados Unidos e emancipador dos escravos americanos. Que dia frutífero foi esse, hein!).

A descoberta de Darwin foi deveras perturbadora. A questão da origem do homem talvez seja mais antiga do que a nossa própria espécie. Talvez nossos ancestrais como o Homo habilis, o "faz-tudo", que fabricava instrumentos de pedra há 2 milhoes de anos, já tivesse elaborado algum questionamento sobre isso. Há milhares de anos, as mais diferentes culturas elaboraram diversas mitologias especulando como teria sido nossa origem. A própria idéia de que as espécies evoluem não é tão nova, já tendo sido discutida pelos antigos gregos (por exemplo, Lucrécio). O próprio avô de Charles, o cientista Erasmus Darwin, era um filosofo natural e acreditava que as espécies se transformavam ao longo do tempo, mas não sabia como. Outro grande cientista que tentou responder essa questão foi Lamarck, com sua teoria dos caracteres adquiridos. Mas apenas em meados do século XIX isso foi resolvido definitivamente, por Charles Darwin.

Darwin fez sua famosa viagem no navio HMS Beagle, cujo capitão era Robert FitzRoy, ao redor do mundo, uma viagem que durou cinco anos. Darwin então coletou dados sobre diversas áreas como biologia e geologia. Nós temos a errônea impressão de que ele estava procurando dados para apoiar sua teoria sobre a evolução, mas quando ele embarcou no Beagle isso nem passava pela sua cabeça. A viagem do Beagle foi apenas um dos eventos que possibilitou futuras conjecturas por parte de Darwin. Ele estava apenas interessado em estudar história natural e geologia. É interessante verificarmos a quantidade de áreas que ele teve que estudar para poder elaborar sua teoria. Por exemplo, teve que estudar até mesmo economia, onde analisou uma idéia que respondia alguns dos seus questionamentos. Ele sabia que os indivíduos de uma mesma população apresentavam pequenas variações, sabia que populações diferentes separadas por questões geográficas durante muito tempo tendiam a ficar diferentes, observou semelhanças entre indivíduos de populações diferentes o que o levava a pensar que possivelmente tinham ancestrais comuns, mas uma coisa que ele não sabia era: "Por quê alguns sobrevivem e outros morrem?".

Anos depois da viagem do Beagle, já em terra firme, Darwin leu um ensaio de Thomas Malthus, um grande economista político e estudioso sobre demografia, chamado "Ensaio sobre o Princípio da População" que falava sobre uma prova estatística de que a capacidade de reprodução da população humana supera muito a capacidade dos seus meios de sobrevivência (como alimentação, por exemplo) o que leva a uma competição para sobreviver. O Princípio da População de Malthus é o seguinte: "O poder da população é tão superior ao poder da terra em produzir subsistência ao homem, que a morte prematura deve de uma forma ou de outra visitar a raça humana. Os vícios do homem são ativos e hábeis para a despopulação. São precursores nas grandes armas de destruição, e frequentemente terminam o serviço com as próprias mãos. Mas caso falhem nessa guerra de exterminação, outros meios como períodos de doenças, epidemias, pestilência e pragas avançam de forma terrível e varrem milhares ou dezenas de milhares. Mesmo que isso ainda seja insuficiente, gigantes e inevitáveis períodos de fome ocorrem, e como uma potente explosão, levam a população à morte com a pouca comida do mundo.". Em outras palavras, as populações reproduzem-se numa taxa superior a capacidade de recursos para sobrevivência. Como uma conseqüência lógica disso, Darwin percebeu que teria que haver uma luta pela sobrevivência, e que os indivíduos que estivessem mais bem equipados, que fossem mais fortes, no ambiente em questão, teriam significativa vantagem diante dos outros.

Finalmente, juntando todas as idéias, Darwin conseguiu explicar de forma convincente e coerente o mecanismo chave da evolução: a Seleção Natural. Uma idéia que baseia-se em quatro processos: (1) variação genética; (2) produção excessiva de descendentes ou prole; (3) luta pela sobrevivência; (4) sobrevivência e reprodução diferencial. Em resumo, nas populações todos os indivíduos são diferentes entre si devido às mutações genéticas e cruzamentos, ocorrem uma reprodução exagerada onde o número de indivíduos supera a capacidade de subsistência do ambiente, por isso os indivíduos competem entre si pelos recursos (alimentação, parceiros sexuais, clima etc.), e finalmente ocorre uma sobrevivência diferencial, onde alguns são beneficiados em detrimento dos outros e alguns têm maior probabilidade de se reproduzir do que outros. A seleção natural atua como uma "peneira" através das gerações, acumulando as variações mais bem adaptadas e eliminando aquelas desfavoráveis. As populações mudam em resposta a pressões ambientais e tornam-se adaptadas a novas condições, mudando ao longo do tempo. A Teoria da Evolução das Espécies pode ser explicada em uma frase: "A sobrevivência não-aleatória de variações aleatórias de códigos genéticos.". De fato, é uma idéia tão simples, poderíamos até mesmo dizer que infantil, de certa forma, mas tremendamente perturbadora (realmente, muitos não acham tão agradável a idéia de que nós, seres humanos, somos descendentes de lesmas rastejantes hermafroditas acéfalas, apesar de isso ser a mais pura verdade). Mesmo sendo uma idéia simples, o seu entendimento não é tão fácil, pois é contra-intuitivo e envolve questões (inclusive com implicações filosóficas profundas) com as quais não estamos acostumados a pensar (imensos períodos de tempo, acumulo gradual de pequenas mudanças etc.). Espero explicar sobre isso num futuro texto.

Charles Darwin, verificando que sua teoria era tão consistente e que explicava magnificamente as observações do mundo natural, e também vendo que isso abalaria a sociedade e o mundo, ficou receoso em expor sua idéia. Na verdade, ele adiou a publicação do seu livro por quase vinte anos, com medo das reações do povo. Em uma carta ele escreveu: "Sinto-me como se estivesse confessando um assassinato.". Explicar as origens do homem por meios exclusivamente naturais, na época, era como cometer uma grande heresia. Tanto que no seu livro "A Origem das Espécies", ele não cita o homem, fazendo apenas uma breve menção num dos últimos parágrafos do livro (alguns anos depois, vendo o sucesso que sua teoria fez, escreveu um novo livro especificamente sobre a origem do homem: "A Descendência do Homem"). A coragem que ele teve para publicar seu livro sobre a origem das espécies também veio por causa de um colega chamado Alfred Russel Wallace que, em paralelo, estava desenvolvendo uma teoria similar à teoria de Darwin e lhe enviou uma carta em 1858 pedindo que examinasse algumas idéias. Então, vendo que Wallace poderia antecipar a publicação da sua descoberta, Darwin se viu forçado a publicar logo seu livro, tomando o cuidado de fazer uma menção a Wallace e reconhecendo que ele tinha paralelamente começado a desenvolver a explicação da origem das espécies. Porém, a teoria de Darwin era muito mais completa e ia bem mais longe do que Wallace tinha ousado pensar, além de ter sido desenvolvida bem antes.

Apesar de tudo, o livro "A Origem das Espécies Através da Seleção Natural" publicado em 22 de Novembro de 1859, teve as 1.250 cópias vendidas imediatamente no mesmo dia. A segunda edição, lançada em 7 de Janeiro de 1860 (ou seja, 1 mês e meio depois), com 3.000 cópias também foi rapidamente esgotada. Durante o restante da vida de Darwin, houveram 6 edições do livro. Hoje em dia, é um dos maiores livros que já foi escrito em toda a história da humanidade (talvez até o maior livro).

Quando eu comecei a ler livros sobre a teoria da evolução, li primeiro os mais atuais, com as novas descobertas, coisas que Darwin nem poderia saber na época. Eu tinha a ilusão de que o livro de Darwin fosse um pouco básico demais. Mas quando finalmente li o livro de Darwin, "A Origem das Espécies", vi que eu estava totalmente enganado (eu penei pra entender muita coisa). O livro é bastante profundo, não deixa nada a desejar, tem inúmeros detalhes, vários exemplos, inclusive é bastante atual (apesar de algumas coisas obsoletas), mas eu vi como Darwin foi genial e como ele era sábio. É uma leitura altamente recomendada. Inclusive verifiquei muitas previsões que Darwin fez sobre outras teorias que só foram desenvolvidas no século XX (por exemplo, Teoria do Equilíbrio Pontuado) e que ele tinha verdadeiramente muito material, evidências, provas e embasamento para defender a idéia da evolução acima de qualquer suspeita.

Então, desejo um Feliz Dia de Darwin para todos!